sábado, 24 de setembro de 2011

A releitura

Uma atividade muito polêmica nas nossas escolas é da releitura de obras de arte. Eu lembro de já ter substituído professoras que trabalhavam com releitura, e via um monte de alunos emburrados copiando um xerox de um quadro paisagens da Djanira ou de Di Cavalcanti. Eu tentava animá-los, ajudando e tentando explicar alguma coisa de deenho, mas a coisa realmente funcionava meio mal.
Muitos afirmam dizem releitura não é cópia, o que faz com que muitos professores insistam numa variação da apropriação(Em que os alunos são incentivados a copiar os quadros colocando elementos modernos ou pessoais, como óculos de sol na Abaporu da Tarsila do Amaral), mas eu creio que isso é bastante problemático.
A apropriação funciona quando tanto o artista quanto o público conhecem muito bem as obras apropriadas. Por exemplo, citações e sátiras à primeira capa da revista Action Comics com o Super-Homem(A primeira aparição do personagem nos quadrinhos) costumam fazer sucesso entre fãs de quadrinhos, mas são ignoradas pelo resto das pessoas.
É dificil definir um quadro clássico que todos os alunos conheçam, com exceção da Mona Lisa(Que já foi tantas vezes alvo de apropriação) . Logo, geralmente, o aluno vai desenvolver uma releitura, uma apropriação de um quadro que ele vê pela primeira vez, seguindo as diretrizes de um adulto, com um resultado final que foge totalmente das características do quadro original.
Isto me parece mais com a criação de um produto estético pobre que vai emprestar seu valor estético de uma obra conhecida(Ou seja, se vê um desenho sem grandes valores estéticos que só tem valor por lembrar um quadro famoso) que uma atividade que vá ampliar os horizontes culturais de um aluno.
E é preciso bater em outro ponto: cópia não é necessariamente ruim. Todo artista conhecido passa pelo processo de estudar, copiar fotos e quadros - antigamente, era muito comum ver gente em museus desenhando quadros, e muitas pessoas que trabalham com arte abstrata estudaram(Ou seja, copiaram) quadros clássicos. Não me parece que coibir o uso pelos alunos de um procedimento padrão entre artistas seja produtivo.
Claro, quando eles decalcam desenhos do Mickey ou do Pokémon estão fazendo um processo improdutivo porque copiam uma solução pronta sem nenhuma relação com a natureza. Claro que este não é o caso de um quadro clássico ou fotografia.
Na verdade, creio que o problema está em dois pontos: não é todo trabalho feito em sala de aula que precisa ser bem elaborado para ser bem exposto no corredor. Pode-se criar atividades de estudo antes de se criar um trabalho mais elaborado. Desenhos com retratos de fotos podem servir de caminho antes de se trabalhar com a criação de obras de arte originais. Além do mais, como se sabe, artistas diferentes criam retratos diferentes quando trabalham com modelos diferentes ou mesmo fotos diferentes.
Outro ponto é que dentro da arte a cópia, ou seja, o estudo, sempre foi de obras de arte realistas e bastante complexas, não de obras simples aonde o conceito é mais importante que a forma. Picasso e Matisse faziam estudos de artistas clássicos como Rafaello Sanzio e http://farm1.static.flickr.com/200/469437321_8149ea6116_m.jpgPoussin, não de artistas modernos do seu tempo. E claro, a quantidade de linhas, elementos, detalhes e formas num quadro clássico implicam também que há um maior espaço para alterações.
Num quadro como a Abaporu da Tarsila do Amaral(O quadro talvez mais usado em releituras) a única forma de não se copiar o quadro ao se fazer um estudo é pintando a personagem de verde ou azul ou ainda colocando alegorias totalmente alienígenas num quadro, como óculos escuros ou celulares. Uma outra alteração poderia criar um desenho sem nenhuma relação com o quadro original, que é bastante simples na sua composição. Não são elementos de sátira nem adicionam nenhum valor ou qualidade de associação ao quadro(E são coisas que podem ser feitas tranquilamente entregando-se uma reprodução do quadro, revistas velhas, cola, tesoura e similares para as crianças).. http://farm2.static.flickr.com/1208/1442338163_34421106ae_m.jpg
Por outro lado, peguemos um quadro de Rafaello Sânzio, como este retrato do Papa Leão X. Não é preciso vesti-lo como rapper ou como sambista para se descaracterizar o quadro. Pode-se simplesmente fazer uma caricatura dele, realçar determinadas características, alterar a roupa, aumentar a orelha ou mesmo traçar o desenho com tons de cartum. O desenho tem tantas linhas e elementos que as possibilidades são infinitas. Por exemplo, este desenho está bem longe de ser o trabalho mais original e interessante que me fizeram com esta técnica(Foi um dos poucos que consegui manter nos meus arquivos).
E bem, ainda é um estudo do quadro original. Quer uma releitura eficiente e divertida? Esqueça Miró, Tarsila do Amaral e Picasso e invista em Rafael, Velasquez e Rembrandt. Quadros do Barroco, que costumam ter zilhões de elementos, linhas mais orgânicas e claro-escuros. Claro, há vários detalhes. Coloque sempre retratos, por motivos óbvios(A não ser que seus alunos sejam virtuoses que consigam copiar um quadro de cenas históricas) e claro, isso significa orientar seus alunos sobre como fazer o trabalho. Aula de artes não significa simplesmente definir um tema para que seus alunos trabalhem. Signfica supervisionar e auxiliar sempre que necessário.
Eu costumo colocar na lousa um pequeno esboço do quadro, seguindo a atividade já trabalhada com o assunto. mas as possibilidades são infinitas.
(Antes que reclamem, Tarsila do Amaral é uma das minhas artistas brasileiras favoritas).

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